PERGUNTAS QUE A CIÊNCIA JÁ RESPONDEU

A renda básica universal em 10 pontos

Katarina Pitasse Fragoso, Rogério Barbosa, Marcos Paulo de Lucca-Silveira e Renata Bichir 10 de Fevereiro de 2021 (atualizado 4 de Janeiro de 2024)

Considerada ‘farol’ para as políticas públicas do século 21, proposta voltou ao debate público depois da pandemia do novo coronavírus. Entenda o que pesquisas dizem sobre o tema

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No ano de 2020, o tema da renda básica foi bastante discutido em todo mundo. Em meio à pandemia do novo coronavírus e às políticas emergenciais de transferência de renda implementadas em vários países — como o auxílio emergencial instituído no Brasil — , ideias relacionadas à chamada renda básica universal pareceram funcionar como um farol e um ideal para as políticas públicas do século 21.

Mas em que exatamente consiste esse programa? Qual sua diferença com respeito aos programas sociais já existentes? Seria a renda básica possível ou uma utopia irrealizável? Quais seriam suas consequências positivas e negativas, se implementada? Tentamos aqui endereçar essas e diversas outras perguntas. Elaboramos uma espécie de “tutorial da renda básica” na forma de perguntas e respostas.

1. O que são programas de transferência de renda?


transferência de renda quando o Estado efetua pagamentos de quantias em dinheiro para seus cidadãos, utilizando verbas advindas da coleta de impostos ou de outras fontes.

Políticas desse tipo podem ter caráter contributivo ou não contributivo...

2. O que é a renda básica universal?


A RBU (renda básica universal) é uma proposta de transferência de renda não contributiva com pagamentos monetários periódicos a todos os cidadãos, sem qualquer exigência preestabelecida. Contemporaneamente, essa ideia foi elaborada pelo filósofo belga Philippe Van Parijs. Para ele, a RBU deveria propiciar uma renda alta o suficiente para garantir uma vida sem privações...

3. Quais as semelhanças e diferenças entre a renda básica universal e outras políticas sociais e programas de transferência de renda?


Por ser universal, a RBU se diferencia dos programas assistenciais focalizados, que têm público restrito e regras de elegibilidade. Seu caráter incondicional implica que contrapartidas de comportamentos específicos não são exigidos.

Os pagamentos monetários se diferenciam, por exemplo, de doações de cestas básicas, disponibilização de remédios ou concessão de “vales” para finalidades específicas...

4. Quais são os pontos positivos da renda básica universal, segundo seus defensores?


De acordo com Philippe Van Parijs e Yannick Vanderborght, garantir um benefício básico a todos os cidadãos de uma sociedade permitiria maior liberdade individual

5. A renda básica universal reduziria mais a desigualdade de renda e a pobreza do que os programas assistenciais focalizados?


Como a RBU implica transferências de quantias idênticas de recursos para toda a população, estaríamos melhorando, simultaneamente, as vidas de pessoas pobres e ricas — logo, também mantendo parte das distâncias e desigualdades entre elas, em termos de seus rendimentos...

6. A renda básica universal poderia acarretar consequências negativas para a sociedade?


Apesar de seus benefícios, a RBU pode ter efeitos negativos. Um deles é a inflação. A garantia de mais rendimentos para diversos setores sociais poderia aumentar a demanda por certos itens de consumo, fazendo com que comerciantes e prestadores de serviço respondessem com aumentos de preços.

Outro efeito negativo da RBU seria a pressão sobre os gastos públicos...

7. Existem experiências da renda básica universal?


A proposta da RBU nunca foi institucionalizada perfeitamente. Porém, experimentos com algumas características da renda básica universal têm sido utilizados ao redor do mundo.

Um dos casos emblemáticos é o Dividendo do Fundo Permanente do Alasca , pago a todos os residentes do estado americano, incluindo as crianças...

8. Quanto custaria um programa de renda básica universal no Brasil?


Para responder a essa questão, talvez seja mais importante definir antes o valor do benefício a ser pago, para então investigar qual o escopo e intensidade de mudanças necessárias no orçamento público.

Um programa “barato” poderia ser custeado por meio de rearranjos no orçamento, tomando parte das verbas de políticas existentes sem que programas prioritários sofressem cortes...

9. Por que ainda é importante debater e levar a sério a ideia de renda básica universal?


Não há dúvidas de que a RBU seja uma grande ideia para transformar a nossa sociedade, ainda que não seja uma panaceia que elimine todas as mazelas. Alguns a enxergam como uma utopia do nosso tempo — algo impossível e irrealizável. Mas a noção de utopia para seu formulador, Thomas More, também diz respeito a um lugar desejável. Isso significa que tais “ideias utópicas” podem ser uma fonte de inspiração e norte...

10. Por que falamos tanto da RBU recentemente?


O tema vinha ganhando importância nas discussões sobre o destino dos mercados de trabalho. Analistas receiam que, em função do avanço tecnológico em diversas ocupações, o trabalho humano poderia ser substituído pela atividade de algoritmos e máquinas...


Katarina Pitasse Fragoso é doutora em filosofia pelaUCLouvain (Université Catholique de Louvain) e realiza pós-doutorado no Departamento de Ciência Política da Universidade de São Paulo. É pesquisadora do CEM (Centro de Estudos da Metrópole) e do Cebrap (Centro Brasileiro de Análise e Planejamento). Com financiamento da Fapesp, desenvolve pesquisa sobre desigualdades relacionais nas cidades, política participativa e integração social de grupos oprimidos.

Rogério Jerônimo Barbosa é doutor em sociologia pela USP (Universidade de São Paulo) e professor doIESP (Instituto de Estudos Sociais e Políticos) da UERJ (Universidade do Estado do Rio de Janeiro). É pesquisador associado do CEM (Centro de Estudos da Metrópole).

Marcos Paulo de Lucca-Silveira é doutor em ciência política pela USP (Universidade de São Paulo) e professor daEESP-FGV (Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getulio Vargas). É pesquisador da FJLES (Fundação José Luiz Egydio Setúbal) e pesquisador associado do CEM (Centro de Estudos da Metrópole).

Renata Mirandola Bichir é professora doutora da EACH/USP no curso de Gestão de Políticas Públicas e diretora científica do CEM. Atua na pós-graduação em Gestão de Políticas Públicas da EACH e no Departamento de Ciência Política da USP. É graduada em ciências sociais pela Universidade de São Paulo (2002), mestre em ciência política também pela Universidade de São Paulo (2006) e doutora em ciência política pelo IESP-UERJ (2011). Entre 2011 e 2013 foi coordenadora-geral de resultados e impacto do Departamento de Avaliação da Secretaria de Avaliação e Gestão da Informação do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (SAGI/MDS). Seus temas de pesquisa incluem análise de políticas públicas, pobreza, assistência social, análise de redes sociais e segregação residencial.