O descompasso entre a legislação e brechas introduzidas para poder burlá-la são uma constante na política indigenista até nossos dias. Desde o período colonial, a legislação afirmou a liberdade dos indígenas e seus direitos originários sobre as suas terras. No entanto, várias brechas legais e estratagemas permitiram amiúde a escravização dessas populações bem como a apropriação de seus territórios.
No século 19, o incentivo a aldeamentos e a possibilidade de, além do Governo Imperial, as províncias também legislarem sobre a política indigenista, resultaram grande esbulho das terras indígenas, sobretudo no Nordeste e Sudeste do Brasil. Em 1906, a responsabilidade da política indigenista voltou a ser exclusivamente da União. A partir de 1934, todas as Constituições do país reconheceram os direitos dos indígenas a suas terras. Mas foi a Constituição Federal de 1988, após um período violento de espoliação de territórios na Amazônia, que explicitou com mais força a importância do indigenato como base dos títulos sobre as terras. Assim, desde 1988, os direitos dos indígenas sobre seus territórios são reconhecidos como originários, ou seja, anteriores ao próprio Estado. O Estado não os outorga, mas a Constituição confere ao Estado a obrigação de reconhecê-los, protegê-los e terminar a demarcação e homologação de suas terras até 1993.
Nesse tempo, novamente subterfúgios têm sido usados para retirar direitos de povos indígenas removidos de seus territórios pela força, sobretudo no Centro-Oeste. A partir de 2019, no governo de Jair Bolsonaro, invasões de garimpeiros, madeireiros e grileiros se intensificaram em terras indígenas. Normativa recente da Funai, flagrantemente inconstitucional, está agora permitindo certificação de invasões de terras indígenas. Conflitos de terras e violência têm recrudescido.
Apresentamos aqui um histórico dos principais marcos legais desde 1680, a partir de levantamento realizado para o Projeto P/BIO (CNPq 421752/2017-3) - Diagnóstico Povos Indígenas e Comunidades Tradicionais no Brasil: contribuições para a biodiversidade, ameaças e políticas públicas (no prelo).