Regime de Colaboração na educação

Fernanda Castro Marques
Gabriel JaburAdolescentes estão sentados em carteiras de uma sala de aula. Eles parecem concentrados, escrevendo em uma folha de papel.Estudantes fazem atividade em sala de aula
O regime de colaboração é considerado uma estratégia fundamental na definição de ações e prioridades na educação. Entenda o conceito
  • Origem do termo regime de colaboração

    A redemocratização trouxe importantes mudanças no cenário nacional, entre elas a definição de competências concorrentes e comuns entre os entes federados na educação. De modo a viabilizar a implementação de tais competências, a Constituição de 1988 apresentou a principal novidade do federalismo educacional: a proposta do regime de colaboração.

    Esse termo, inaugurado na Constituinte de 1988, é descrito no artigo 211 da seguinte forma: “A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios organizarão em regime de colaboração seus sistemas de ensino”. Vale destacar que o conceito é proposto exclusivamente para a política educacional, sendo reforçado posteriormente na Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB/1996) e no Plano Nacional de Educação (PNE/2014).

    O regime de colaboração tem, portanto, raízes constitucionais, apontando para uma gestão educacional democrática e solidária. É uma herança importante para os gestores e profissionais da educação de todo o Brasil.

  • Significado do regime de colaboração

    O Brasil é uma federação, e essa forma de organização político-administrativa afeta diretamente a definição e a implementação das políticas educacionais. Os sistemas estaduais e municipais de educação são responsáveis pela aprendizagem de estudantes de todo o Brasil.

    Para evitar competição entre os entes federados e problemas de coordenação, o regime de colaboração propõe que os sistemas de ensino organizem suas redes de forma colaborativa. Mais do que evitar conflitos, o regime implica a possibilidade de construção de políticas colaborativas conjuntamente, além do compartilhamento de boas práticas e experiências entre os gestores.

    O regime de colaboração é um elo importante para a pactuação das políticas em todos os níveis federativos e seus sistemas de ensino. Em um país tão heterogêneo territorialmente e com condições e capacidades sociais, econômicas e educacionais distintas, a tomada de decisão de um nível federativo para outro tem de respeitar as particularidades de cada território. Por isso colaborar é tão necessário, pois permite que haja decisões e pactuações que respeitem tanto a autonomia dos entes subnacionais quanto a interdependência necessária entre os entes federados para a coordenação e garantia de uma educação de qualidade.

  • Cooperação interfederativa

    Na literatura e legislação brasileira é possível encontrar colaboração e cooperação, utilizados ora como complementares, ora como equivalentes. Apesar de seu objetivo ser o mesmo — promover maior coordenação no cenário educacional —, há uma pequena diferença de natureza legal entre eles. Na Constituição Federal de 1988, encontramos os contextos em que esses termos são utilizados:

    • Art. 23, parágrafo único: “Leis complementares fixarão normas para a cooperação entre a União e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, tendo em vista o equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional”.
    • Art. 211: “A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios organizarão em regime de colaboração seus sistemas de ensino.”

    A cooperação se dá, portanto, entre os entes federativos, quando União, estados e municípios definem normas em comum para a educação. Já a colaboração ocorre entre os sistemas de ensino federal, estadual e municipal por meio de instrumentos colaborativos. Por exemplo, o transporte escolar: o estado, em cooperação com seus municípios, irá reuni-los para discutir sobre a oferta de ônibus escolares disponíveis, considerando condições de gestão e orçamento. Feito isso, em regime de colaboração, serão pactuadas, pelos sistemas de ensino estadual e municipais de ensino, as rotas de transporte e as possibilidades de trabalho colaborativo acerca da mobilidade dos estudantes.

    Apesar de essa ser uma sutil diferença, a cooperação e a colaboração se mostram complementares e fundamentais para a política educacional.

  • Tipos de regime de colaboração

    Entre estados e municípios: ambos, conjuntamente, podem construir políticas, considerando o estudante como pertencente a um único território e promovendo intensa colaboração na indução de mecanismos e instrumentos que fortaleçam a aprendizagem. No estado do Ceará, a decisão pelo Regime de Colaboração foi estruturante para a implementação do PAIC (Programa de Alfabetização na Idade Certa), desenvolvido a partir de diálogo entre diferentes atores na definição das prioridades educacionais estaduais.

    Entre municípios: esse tipo de colaboração geralmente ocorre em consórcios e arranjos, mecanismos fundamentais para a educação em âmbito regional. O arranjo da Chapada Diamantina, originário da década de 1990, realiza até hoje um trabalho de formação de gestores educacionais, impactando o Ideb da região. Como a maioria dos municípios brasileiros é de baixo contingente populacional, trabalhar em colaboração com o município vizinho é uma alternativa de alto potencial para a resolução de problemas de gestão e pedagógicos, bem como para o fortalecimento de ações e programas educacionais.

    Entre União, estados e municípios: a União, por meio de sua assistência técnica e financeira, também deve se pautar na colaboração para pactuar as decisões e ações com os entes subnacionais por meio dos programas federais. Em 2018, o MEC (Ministério da Educação), o Consed (Conselho Nacional de Secretários Estaduais de Educação) e a Undime (União dos Dirigentes Municipais de Educação) firmaram o ProBNCC (Programa de Implementação da Base Nacional Comum Curricular). Por meio dele, União, estados e municípios trabalharam conjuntamente para revisão de seus documentos curriculares.

Bibliografia

ABRUCIO, F; SEGATTO, C. Os múltiplos papéis dos governos estaduais na política educacional brasileira: os casos do Ceará, Mato Grosso do Sul, São Paulo e Pará. In Revista de Administração Pública. Rio de Janeiro. Nov./Dez. 2018

ABRUCIO, F.; WEBER, M. Cooperação intermunicipal: experiências de Arranjos de Desenvolvimento de Educação no Brasil. Curitiba: Positivo, 2017.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal

BRASIL. Lei nº 9394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Brasília, DF

BRASIL. Lei nº 13.005, de 25 de junho de 2014. Aprova o Plano Nacional de Educação e dá outras providências. Brasília, DF

MOVIMENTO COLABORA. Guia de Regime de Colaboração, 2019. Disponível aqui.

MOVIMENTO COLABORA. Novas Gestões Municipais - O que é preciso saber sobre Regime de Colaboração, 2020. Disponível aqui.

RAMOS, M. Arranjos de desenvolvimento da educação. In ABRUCIO, F.; Ramos, M. Regime de colaboração e associativismo territorial: arranjos de desenvolvimento da educação. São Paulo: Fundação Santillana, 2012. p. 67-84.

Fernanda Castro Marques é mestre e doutoranda em administração pública e governo pela FGV-Eaesp. Pesquisa o tema de educação sob perspectiva do federalismo educacional, regime de colaboração e governança federativa. Atualmente, é coordenadora da área de gestão de conhecimento e produção de conteúdo no Movimento Colabora Educação. É pesquisadora convidada do CPTE (Centro de Pesquisa Transdisciplinar em Educação) do Instituto Unibanco.

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