Marina Ribeiro Corrêa
Desafios e oportunidades para a gestão ecossistêmica de praias
Dissertação de mestrado
Serviços ecossistêmicos e suas vulnerabilidades às mudanças climáticas: desafios e oportunidades para a gestão ecossistêmica de praias
autora
orientador
Alexander Turra
Área e sub-área
Ciência ambiental, Gestão costeira
Defendido em
Programa de Pós-Graduação em Ciência Ambiental do Instituto de Energia e Ambiente da Universidade de São Paulo em 19/05/2021
O oceano e a zona costeira vêm sofrendo diversos impactos e deixando de prover alguns benefícios ao bem-estar humano. Esse cenário levou a uma busca por novas estratégias de gestão para esses ecossistemas, entre eles as praias. Uma das novas estratégias de gestão propostas é a GBE (Gestão Baseada em Ecossistemas), que tem como meta manter o ecossistema em uma condição saudável, produtiva e resiliente para que ele possa prover benefícios ao bem-estar humano em longo prazo.
Esta dissertação de mestrado, desenvolvida no Programa de Pós-Graduação em Ciência Ambiental do IEE-USP (Instituto de Energia e Ambiente da Universidade de São Paulo), investiga as possibilidades e os desafios da implementação da GBE nas praias da América Latina e do Caribe, onde a degradação e as ameaças às regiões costeiras reforçam a inadequação da gestão atual.
Entre os resultados da pesquisa está o papel de destaque dos gestores locais para a adoção de um novo paradigma de gestão de praias e a necessidade de fortalecer a relação entre ciência, gestão e sociedade.
A qual pergunta a pesquisa responde?
Este estudo teve como objetivo contribuir com a discussão sobre a implementação da GBE (Gestão Baseada em Ecossistemas) em praias, trazendo, principalmente, aportes para o contexto da AL&C (América Latina e Caribe) e para sua implementação em nível municipal. No primeiro capítulo foi feita uma reflexão geral sobre as oportunidades da incorporação da GBE na gestão de praias e os desafios para sua implementação na AL&C. Os outros dois capítulos utilizaram em um estudo de caso o conceito de vulnerabilidade dos Serviços Ecossistêmicos (SE) como ferramenta de comunicação com gestores costeiros municipais do Litoral Norte Paulista para investigar como suas narrativas podem significar oportunidades e/ou desafios para a implementação de práticas sustentáveis, como a GBE, na gestão de praias diante das mudanças climáticas. Os SE são as contribuições do ecossistema que fornecem benefícios ao bem-estar humano, conectando, assim, a dimensão ecológica e a humana, paradigma fundamental para garantir a sustentabilidade.
Por que isso é relevante?
A gestão disciplinar, fragmentada e sem participação social criou estruturas institucionais e processos de tomada de decisão com tendência a criar soluções simples e insuficientes para lidar com problemas socioambientais complexos, como por exemplo garantir a integridade do oceano e zona costeira frente à emergência climática. Esse cenário levou ao fomento de novas estratégias de gestão para as regiões marinhas e costeiras, que contraponham sistemas de gestão convencionais e incorporem a necessidade de restaurar e manter a saúde dos ecossistemas, como a GBE ): uma abordagem sistêmica, adaptativa, participativa e com perspectiva de longo prazo. Uma das estratégias de implementação da GBE é diagnosticar vulnerabilidades socioecológicas e responder a elas com antecedência, podendo, assim, ser operacionalizada a partir da manutenção da provisão de longo-prazo de SE).
A implementação da GBE em praias é um passo fundamental para garantir a sustentabilidade deste ecossistema (Sardá et al., 2015). Esse cenário é exacerbado em países da América Latina e Caribe , nos quais as ameaças às praias reforçam a discussão quanto à inadequação dos métodos atuais de sua gestão (Botero; Williams; Cabrera, 2015). Entretanto, para que se transforme uma gestão no sentido da abordagem ecossistêmica, deve-se entender quais fatores são catalisadores ou barreiras dessa mudança (Kelly; Ellis; Flannery, 2018). Nesse sentido, se faz necessário investigar o contexto aplicado da gestão em nível municipal para a implementação da GBE (Leslie et al., 2015), reforçando o possível papel que os atores governamentais locais podem ter nessa transformação (Sardá; Azcárate, 2018).
Resumo da pesquisa
A sustentabilidade das praias depende de uma gestão que lide com as mudanças ambientais e garanta a integridade do ecossistema e a consequente provisão de benefícios ao bem-estar humano, como proposto pela GBE. A AL&C e o ecossistema praial carecem de estudos empíricos e teóricos sobre a implementação da GBE. Assim, o objetivo da presente dissertação foi contribuir com a discussão sobre a implementação da GBE em praias, trazendo, principalmente, aportes para o contexto da AL&C e para sua implementação em nível local. No primeiro capítulo foi feita uma reflexão geral sobre as oportunidades da incorporação da GBE na gestão de praias e os desafios para sua implementação na AL&C. Os outros dois capítulos utilizaram um estudo de caso na AL&C para investigar como a percepção dos gestores governamentais locais sobre a vulnerabilidade dos SE pode influenciar na transformação da gestão de praias local no sentido da GBE.
Por meio de metodologias como levantamento e revisão documental (de políticas públicas, normas legais e literatura científica), workshops com gestores governamentais locais, análise de redes sociais e análise do conteúdo, a dissertação ampliou o conhecimento sobre a implementação da GBE em ecossistemas praiais, fornecendo subsídios para seu manejo sustentável, principalmente na gestão local e na AL&C. Portanto, junto a uma reflexão sobre as oportunidades da incorporação da GBE na gestão de praias e as possíveis barreiras e catalisadores para sua implementação na AL&C, a análise da percepção dos gestores governamentais locais sobre a vulnerabilidade dos SE reforçou a importância desses atores para a implementação da GBE. Essa análise não apenas trouxe quais esclarecimentos conceituais e estruturais são necessários em termos da implementação abordagem ecossistêmica em praias, como também foi uma oportunidade de cooperação entre pesquisadores e gestores na adaptação do atual sistema de governança.
Quais foram as conclusões?
Observou-se que a GBE pode orientar a adequação dos processos da gestão de praia, sendo uma abordagem a ser fortalecida na AL&C se considerados os desafios a serem enfrentados para sua implementação na região (por exemplo,. gestão fragmentada, processos participativos enfraquecidos, descontinuidade de planos de gestão e programas de pesquisa etc.). Para enfrentar essas barreiras, reforçou-se a cooperação entre os países da região e sua importância na pesquisa de sistemas socioecológicos, interação ciência-gestão, e abordagens que envolvem a co-construção de conhecimento com a sociedade (abordagens transdisciplinares).
No estudo de caso, ao analisarmos como a visão dos gestores governamentais locais sobre a vulnerabilidade dos SE pode influenciar a implementação da GBE em praias no nível local, os gestores locais foram entendidos como líderes potenciais e sua percepção como uma precondição crítica a ser considerada para a transformação da gestão de praias no sentido da GBE. Coletivamente eles apresentaram uma visão sistêmica de longo prazo e perceberam a necessidade de uma gestão mais integrada, coesa e participativa. Mostraram, assim, potencial para aumentar a capacidade adaptativa da gestão e enfrentar muitos dos desafios encontrados na AL&C.
Para que o potencial dos gestores como líderes se materialize, é preciso formar uma rede intermunicipal e fortalecer a relação ciência-gestão e abordagens transdisciplinares e participativas, preenchendo lacunas de conhecimento em termos da abordagem ecossistêmica. Nesse sentido foi compreendido o papel fundamental dos fóruns regionais ambientais (ex. conselhos de unidades de conservação) como facilitadores da implementação da GBE em nível local, devido seu potencial de promover a integração regional e fortalecer a relação ciência-gestão-sociedade.
Quem deveria conhecer os seus resultados?
Meus resultados deveriam ser conhecidos por outros pesquisadores interessados pelo tema, por gestores governamentais e pela sociedade civil. Outros pesquisadores porque o trabalho traz uma perspectiva nova sobre a implementação da Gestão Baseada em Ecossistemas, cobrindo lacunas de conhecimento relevantes para as áreas de pesquisa abordadas. Por gestores governamentais, porque meus resultados trazem aportes e reflexões para a implementação de novas estratégias para a gestão de praias e sustentabilidade desse ecossistema. Pela sociedade civil, pois os resultados trazem a importância de sua participação na gestão para a sustentabilidade, podendo servir de base para que exijam participar mais dos processos decisórios.
Referências
Botero, C.M.; Williams, A.T.; Cabrera, J.A. Advances in beach management in Latin America: overview from certification schemes. In: Finkl, C.: Makowski C. (eds.) Environmental Management and Governance. Coastal Research Library. New York: Springer, 2015. v. 8, p. 33-63.
Kelly, C.; Ellis, G.; Flannery, W. Conceptualising change in marine governance: Learning from transition management. Marine Policy, v. 95, p. 24-35, 2018.
Leslie, H.; Sievanen, L.; Crawford, T.G.; Gruby, R.; Villanueva-Aznar, H.C.; Campbell, L.M. Learning from ecosystem-based management in practice. Ocean & Coastal Management, v. 43, n. 5, p. 471-497, 2015.
Sardá, R.; Lozoya, J.P. A Decision Making (DEMA) tool to be used in Ecosystem-Based Management System (EBMS) applications. In: Botero, C.M.; Cervantes, O.; Finkl, C.W. (eds.) Beach Management Tools – Concepts, Methodologies and Case Studies. Coastal Research Library. Cham: Springer, 2018. v. 24, p. 21-40.
Sardá, R.; Valls, J.F.; Pintó, J.; Ariza, E.; Lozoya, J.P.; Fraguell, R.M.; Martí, C.; Rucabado, J.; Ramis, J.; Jimenez, J.A. Towards a new integrated beach management system: the ecosystem-based management system for beaches. Ocean & Coastal Management, v. 118, Part B, p. 167-177, 2015.
Marina Ribeiro Corrêa é movida pela curiosidade sobre como a relação que as pessoas e instituições têm com o meio ambiente pode ser utilizada para promover soluções sustentáveis. Bacharel e licenciada em ciências biológicas (IB-USP), fez mestrado pelo Programa de Pós-Graduação em Ciência Ambiental (IEE-USP) junto ao Laboratório de Manejo, Ecologia e Conservação Marinha (IO-USP) e se envolveu em diferentes iniciativas, como: Liga das Mulheres pelo Oceano, bloom ocean, Youth Climate Leaders e Instituto Costa Brasilis.